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domingo, 6 de setembro de 2020

Cidadania e Consciência Democrática

                                       

“Só as boas, as grandes, as eternas leituras poderão atenuar ou corrigir o perigo a que se expõe a criança, na desordem de um mundo completamente abalado e em que os homens vacilam até nas noções a seu próprio respeito”. (Cecília Meireles)

O pequeno John não sabe ler porque ao invés de lhe darem um livro, deram-lhe antes uma arma.

Sabemos que no mundo todo, as crianças antes de serem escolarizadas, passam grande parte do dia em frente da televisão, sem terem visto um livro sequer até então.

E armas destrutivas de toda ordem, são exibidas de forma obsessiva em reportagens, filmes, desenhos animados, graças ao fogo cruzado dos satélites.

O universo das imagens é imediato, descontínuo, barulhento, causando na criança, prazer e passividade, enquanto que o mundo do livro é uma lenta mediação contínua, silenciosa, compelindo a criança a uma atividade cujo interesse ela nem sempre domina. Diz-se do espaço real da escola que se proclama aberto, precedido pelo espaço virtual da televisão, fechado sobre si mesmo, autocrático e auto-referencial, como estabelecera definitivamente Mac Luhan: “o meio é sua própria mensagem”.

Mensagem virtual, sujeito virtual e aluno virtual que compreenderá mal a realidade do mundo cultural, em que a escola num certo sentido o compele a entrar.

Em 1.968 Hannah Arendt abordava o problema da crise da educação nos países desenvolvidos, a partir da simples questão de saber por que o pequeno John não sabe ler. A autora denunciava a falência dos métodos modernos de educação (Hannah Arendt – 1.972 páginas. 224,  229 e 230) como haviam compreendido os fundadores de escolas e todos os teóricos de Pitágoras a Platão, de Rebelais a Comenius ou Rousseau, a escola deve fechar-se à vida biológica (ela não é a família) e à vida social (ela não é a cidade) a fim de permitir à criança adquirir os conhecimentos que farão dela um homem. A vida da escola não é de forma alguma a escola da vida.

O historiador Jacques Julliard (1.993) enfatizava a conseqüência inevitável da tese da “escola aberta” que, logo que aplicada, levaria imediatamente à sua destruição. Fazendo da escola um meio aberto, introduzem-se nela todos os tipos de violência: roubos, drogas, agressões, estupros e assassinatos uma vez que a vida social é continuamente tecida com eles - os tipos de violência.

A escola não é o reflexo da vida nem a aprendizagem da existência, mas o lugar por excelência da crítica social, permitindo ao aluno a análise e a compreensão dos processos históricos.

É vital que se lhe seja restituído o caráter sagrado. Para Dewey, a educação é um processo de vida e não uma preparação para a vida futura. Da escola laboratório de Dewey às pesquisas pedagógicas modernas, de deriva em deriva, a pedagogia moderna deixou de julgar a criança pelo pensamento e de apreciar seus conhecimentos em virtude do domínio sobre elas e, numa seqüência de avaliações de somas e notas, passou a julgá-la sem se interessar pelo conteúdo real do ensino e, evidentemente, por aquilo que a criança sente.

Ah livro, dizia Cecília Meireles, despretensioso, que na sombra de uma prateleira uma criança livremente descobrira e pelo qual se encantara, e sem figuras, e sem extravagâncias, esquecera as horas, os companheiros, a merenda. Tu sim és um livro infantil e o teu prestígio será na verdade, imortalE continuava ela, o respeito mútuo, um respeito sem fingimentos e sem rotinas, um respeito bem intencionado, que todos os dias se ilumina de argumentos novos e todos os dias, se sente pequeno diante da sua aspiração;  poderá servir de base dentro da obra da Educação, de um movimento de resultados eficientes no problema urgentíssimo da salvação do mundo pela garantia unânime da paz

A educação para a solidariedade, para o progresso e para a fraternidade foi substituída pelo ódio nestes círculos mundiais do terror explícito ou embrionário.

 A Educação não transforma o Mundo. Educação muda pessoas. Pessoas transformam o Mundo, dizia Paulo Freire.

O Mestre Pitágoras advertia precisar educar as crianças para não ter que punir os adultos. Mais de meio milhão de crianças com idades entre 10 e 17 anos são exploradas como trabalhadores domésticos no Brasil, afirma a Organização Internacional do Trabalho. E, 10 milhões o número de crianças mantidas em regime de escravidão no Mundo – (Fonte: Consciência Net – Jornal do Brasil de 11.06.2004).

É como dizia o dramaturgo Nelson Rodrigues: subdesenvolvimento não se improvisa, é obra de séculos.

Se pretendermos viver num mundo melhor, devemos encontrar meios de superar as imensas desigualdades e injustiças do mundo atual, meios políticos civilizados, pois não será através da barbárie e da intolerância que se espalha como metástase pelo Planeta, que o caminho será encontrado.

Sem esperança, não se pode contemplar estrelas sem temer que toda luz se apague. A luz vence as trevas, assim, como o Sol faz amanhecer o dia. Na periferia das cidades e nos recantos do mundo, o pequeno e o miúdo com desassombro, teimam em reunir-se para sonhar com o futuro.

Parodiando Bahá`v´ Lláh: "Somos o falcão real no braço do Onipotente. Desdobramos as asas caídas de todo pássaro prostrado e impulsionamos-lhe o vôo."

Um velho índio descrevendo seus conflitos internos dizia haver dentro de si, dois lobos um deles cruel e mau, o outro bom e compreensivo e os dois, sempre brigando. Quando lhe perguntaram qual dos dois lobos ganharia a briga, o sábio índio parou, refletiu e respondeu:  "Aquele que eu alimento".

                                                                           Lucrecia Anchieschi

            

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